quinta-feira, 2 de julho de 2015

Concílio Vaticano II






A atualização da Igreja e sua adaptação ao mundo moderno

(Aggiornamento)





Pretendemos mostrar um sumário das contribuições do Concílio Ecumênico Vaticano II para a formulação de um programa de atualização da Igreja e sua adaptação ao mundo moderno.


Um dos maiores desafios que se impõem ao cristianismo na atualidade é o de empreender um diálogo promissor com um mundo complexo e plural. O Concílio Vaticano II, no campo católico, significou um primeiro passo de aproximação, dotando a Igreja de importantes instrumentos doutrinários capazes de iluminar a ação evangélica na condução das urgentes e importantes questões do  mundo real.


Sem ter ideias muito precisas sobre o concílio, João XXIII[1] lhe atribuiu dois objetivos bastante amplos: “uma adaptação (Aggiornamento) da Igreja e do apostolado a um mundo em plena transformação e o retorno à unidade dos cristãos, que o Papa parece planejar para prazos muito curtos, um pouco como a parusia para os primeiros cristãos! ” (COMBY, 2001 p. 208).


Para a Igreja, trata-se menos de lutar contra adversários que de encontrar um modo de expressão para o mundo no qual vive e que ignora. Segundo João XXIII “É preciso sacudir a poeira imperial” que recobre a Igreja, “sendo impossível renovar a Igreja e fazer que ela seja o sinal de Deus para o mundo, sem querer a unidade de todos aqueles que acreditam no mesmo Deus”[2]


Juntamente com a abertura ao mundo, o Concílio inaugura uma nova sensibilidade nos campos ecumênico e do diálogo inter-religioso, assumindo de maneira admirável o otimismo salvífico, ao reconhecer tudo o que há de verdade e graça na singularidade dos fiéis de outras religiões, bem como em suas tradições religiosas. “O ecumenismo não foi um dos assuntos tratados ao lado de muitos outros, mas a preocupação permanente do Concílio” (CECHINATO, 2006 p.427).


Podemos observar que foi, de fato, o primeiro Concílio Ecumênico a tratar o tema das religiões de modo positivo e aberto. O processo desencadeado pelo Concílio provocou uma ruptura no “equilíbrio” anterior, o de uma “identidade católica” tridentina firme, coesa e estável, que resistira durante longo tempo aos assédios dos novos tempos.


Com efeito, os debates nas diversas sessões do Concílio suscitaram na Igreja um movimento acelerado de transformações, que envolve iniciativas nos mais diversos setores, despertando novas energias e abrindo o leque de experiências. Quando o universo da experiência cresce e o pluralismo se expande, o temor pela ruptura da unidade aumenta. Diante do receio provocado pela expansão das experiências e de suas possíveis consequências ao interno da Igreja, começam a surgir inquietações, sobretudo a nível de cúpula, “chefiada principalmente pelo arcebispo Marcel Lefebvre” (BETTENCOURT, 2011 p. 204).


Esse problema decisivo na interpretação do Concílio, foi debatido no Sínodo Extraordinário de 1985, que foi convocado pelo Papa João Paulo II para avaliar os resultados do Concílio Vaticano II, após vinte anos de experiência. Esse evento significou uma tomada de posição decidida no conflito de interpretações do Concílio. Em seu relatório final o Sínodo decide por uma interpretação do Vaticano II que reforça sua continuidade com o Vaticano I e, através dele, com a contra reforma, oficializando uma recepção do Vaticano II que não faz justiça a todas as suas virtualidades, precisamente naquilo que elas tinham de novo e de verdadeiramente original.


O Papa João Paulo II retomando o desafio do Sínodo de 1985, propõe uma “nova evangelização”, capaz de enfrentar decisivamente a contínua difusão do indiferentismo e secularismo e refazer o tecido cristão, atingindo não somente os indivíduos, mas também as culturas. Nesse projeto de uma nova identidade católica a dinâmica de instauração de uma civilização mais cristã torna-se essencial. É tempo de um dinamismo missionário mais efetivo, que supere um certo “afrouxamento” pós-conciliar. No projeto da Nova Evangelização o anúncio explícito de Cristo torna-se nuclear, não bastando aos fiéis permanecer no campo da propagação dos “valores cristãos”.


Em nossa atual conjuntura eclesial o testemunho da fé explícita e a necessidade da Igreja vêm sendo enfatizados como contrapontos ao risco de uma compreensão da missão que tenderia a ser substituída pelo diálogo inter-religioso, ou mesmo restrita ao empenho da promoção humana. 


No Brasil, o Concílio Vaticano II teve pronta aplicação, usando como instrumento privilegiado o PPC (Plano de Pastoral de Conjunto), aprovado pelos bispos brasileiros durante a última sessão do Concílio. “O PPC deu novo impulso à colegialidade episcopal, prática já experimentada no Brasil em anos anteriores e agora apoiada pela doutrina do Vaticano II” (MATOS, 2011 p.191). O Plano enfatizava igualmente a evangelização como missão principal da Igreja, reconhecendo o papel dos leigos e dando importância específica à solidariedade com todos os homens, particularmente os pobres. A evangelização deveria contribuir efetivamente para mudar o sistema de opressão. “A fé, quando autêntica, relaciona-se diretamente com a justiça social” (MATOS, 2011 p. 192).


Desta forma, podemos concluir que, de qualquer lado que se observe, os “ventos” que sopraram do Concílio Vaticano II continuam a ter a finalidade de querer recolocar a Igreja no trilho principal da evangelização do mundo contemporâneo. Tanto a Lumen Gentium com a Gaudium et Spes, só para nos referir às duas constituições mais eclesiológicas, e também a Sacrosanctum Concillium e a Dei Verbum, não fazem outra coisa senão exprimir a mesma idéia de fundo com a problemática subentendida: como exercer a missão principal e prioritária do anúncio do Evangelho de modo renovado e eficaz.





Referências:

BETTENCOURT, Estevão Tavares. Curso de História da Igreja. Rio de Janeiro: Mater Ecclesiae, 2011.

CECHINATO, Pe. Luiz. Os 20 séculos de caminhada da Igreja: principais acontecimentos da cristandade, desde os tempos de Jesus até João Paulo II. 6 ed. Petrópolis (RJ): Vozes, 1996

COMBY, Jean. A História da Igreja II: do século XV ao século XX. 2 ed. São Paulo: Loyola, 2001.

CONCÍLIO VATICANO II. COMPÊNDIO DO VATICANO II: Constituições, decretos e declarações. 29 ed. Petrópolis (RJ): Vozes, 2000.

FISICHELLA, Rino. A Nova Evangelização: um desafio para sair da indiferença. Lisboa: Paulus, 2012.

MATOS, Henrique Cristiano José. Nossa História, 500 anos de presença da Igreja Católica no Brasil, Tomo III: Período Imperial e Transição Republicana. 3 ed. São Paulo: Paulinas, 2011







[1][1]“João XXIII inaugurou o Concílio do Vaticano II aos 11.10.1962; era o 21º da história. Fora preparado desde 1959 por Comissões diversas, que elaboraram estudos e textos a ser apresentados aos conciliares sobre os principais problemas da Igreja daquela época... ...o Concílio decorreu em quatro fases, respectivamente de outubro a dezembro de 1962, 1963, 1964 e 1965. Nos intervalos entre essas fases, as Comissões de peritos trabalhavam arduamente para atender às sugestões e às diretrizes emanadas dos padres conciliares. Tendo João XXIII falecido em junho de 1963, foi sucedido por Paulo VI (1963-1978), que imediatamente assumiu o encargo de levar adiante os trabalhos conciliares em curso” (BETTENCOURT, 2011 p.203)



[2] Pronunciamento efetuado por João XXIII na abertura do Concílio em 11 de outubro de 1962.

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