sábado, 27 de junho de 2015

As Epístolas de São Paulo a Timóteo





O presente trabalho tem como objetivo produzir uma síntese do conteúdo das duas cartas endereçadas à Timóteo pelo apóstolo Paulo no intuito de permitir o entendimento geral de seus conteúdos.

            O nome Timóteo significa no grego “o que honra a Deus”.  O destinatário das Epístolas sob enfoque, assim chamado, era natural de Lystres em Lycaonia e filho de um grego casado com uma judia[1]. Foi por sua mãe e avó educado no judaísmo[2],

            Vale destacar que as mencionadas cartas, juntamente com a carta endereçada a Tito, desde o século XVIII são geralmente conhecidas como ‘cartas pastorais’. “Essas cartas se distinguem das outras do corpus paulinum não tanto porque endereçadas a uma pessoa em particular, mas, sobretudo porque dirigidas a chefes de comunidade com um discurso de caráter oficial que interessa a toda a comunidade (FABRIS, 1992 p 211).

            A crítica bíblica moderna tem contestado seriamente a tese de que Paulo escreveu as chamadas epístolas pastorais. O vocabulário de tais escritos difere das cartas indiscutivelmente paulinas. “Os temas audaciosos das cartas paulinas aqui são apenas preceitos, mas acima de tudo a visão da Igreja tem significativa diferença das encontrada nas cartas de Paulo.” (BERGANT, 2013 p 283).

            Embora valiosa para os estudos históricos, aqui a questão da autenticidade autoral não se faz importante, eis que, pelo motivo elencado, as cartas não são menos valiosas para fé e o seu valor neste trabalho vem do fato de serem inspiradas por Deus e importantes para a Igreja entender a si mesma.

            Podemos notar que tais cartas, sobretudo a 1 Timóteo, parecem códigos ampliados de deveres domésticos, forma comum de exortação na literatura pagã, judaica e cristã. Além disso, são coletâneas de matérias morais bastante tradicionais, que repercutem não só fontes evangélicas, mas conselhos paulinos a suas Igrejas e também elementos originários de Pedro. O que é mais importante é que nelas encontramos um documento formal que atesta a situação atual de Timóteo como chefe religioso e que posteriormente confere autoridade a seus sucessores. “Essas cartas, portanto, realçam a ordem religiosa e a moralidade e, assim, funcionam como constituições oficiais” (BERGANT, 2013 p 283).

            Como todas as Epístolas de Paulo, temos que as cartas sob comento foram compostas em grego. Pode-se notar que a primeira epístola a Timóteo não é organizada e desenvolvida de um modo sistemático e uniforme. Os assuntos tratados são variados e sucedem-se rapidamente. Consta dela duas partes, a saber:

a)    A primeira (capítulos 1 a 3) expõe o que são o serviço e o bem da Igreja.
b)    A segunda (capítulos 4 a 6) o que deve fazer o fiel ministro desta.

A primeira parte começa pelo endereçamento, saudação e uma espécie de preâmbulo sobre o bom combate que o pastor de almas deve sustentar por Cristo e pela Igreja[3], onde Paulo destaca o comportamento genuíno de uma pregação, que deve excluir tudo que seja doutrina vã e estimular o zelo e a caridade. Em seguida, pede orações por todos, principalmente pelos que governam, porque destes depende a conservação da ordem e a tranquilidade pública. Acentua a verdade dogmática de que Deus quer a salvação de todos os homens e Cristo morreu por ela e é o mediador entre seu Eterno Pai e a humanidade. Traça regras sobre o modo licito, decoroso e conveniente de celebrar o culto, mostrando como e por quem devem ser feitas as preces públicas, e que nelas não tem as mulheres papel saliente, e lhes cumpre só acompanha-las[4]. Por último, dá instruções sobre a escolha e formação dos ministros sagrados, rendendo uma solene homenagem à santidade e infalibilidade da Igreja[5].

A segunda parte, que é mais pessoal, subdivide-se também em três partes, sendo que a primeira se ocupa das heresias que surgem, razão pela qual adverte o discípulo para que se lhe dê combate, esclarecendo e instruindo os fiéis e em tudo os guie com a sua palavra e o bom exemplo[6]. Na segunda[7], discorre sobre os deveres do bispo em relação às diversas categorias de pessoas de que se compõe o seu rebanho. Na última parte[8], refere-se às paixões e aos erros e desordens dos que corrompem e repelem o ensino de Jesus Cristo, assinala o mérito inextinguível das boas obras e conclui dirigindo conselhos e exortações especiais e intimas do mestre ao discípulo, que terminam pela de que se acautele contra as novidades da linguagem no que respeita às verdades da fé e contra o que com o falso nome de ciência se opõe a doutrina e aos preceitos da salvação eterna.

Os ensinamentos práticos da primeira epístola a Timóteo são numerosos e de aplicação geral para todos – bispos, sacerdotes, diáconos e leigos.

A segunda epístola de São Paulo a Timóteo pode ser igualmente dividida em três partes, a saber:

a) Preâmbulo com endereço, saudação e ação de graças[9], seguindo com uma exortação a Timóteo, para que, se envergonhar nunca de seu ministério, o desempenhe cada dia mais zeloso e intrépido, tendo inteira confiança em Deus, que o chamou e a Paulo, e o tem sustentado em sua pregação no meio de tantos perigos[10];
b)  Segunda parte dirigida contra falsos doutores que já se mostram em Éfeso, e cujos erros e vícios o apostolo descreve em rápidos e vivos traços, animando-o a combatê-los com coragem, mas sem temer pela Igreja, a qual triunfará também encima de inimigos cada vez mais audazes que hão de surgir[11];
c)    Na terceira[12] faz considerações sobre o dever de guardar a doutrina recebida, o valor múltiplo da Sagrada Escritura e a necessidade, para o pastor, de não cessar a pregação e defender de todos os perigos o rebanho. O epílogo[13] comunica que ele espera a morte, mas com ela o prêmio eterno, que também tocará aos que o imitarem. Dá notícias de si e de outros, pede a Timóteo que venha até ele e consigo Marcos, envia saudações suas a alguns, saúda-o em nome de outros e conclui.

Entre os pontos dogmáticos tratados nesta Epístola notam os seguintes:

a)    O caráter sacramental da Ordem[14];
b)    A necessidade e mérito das boas obras[15];
c)    A inspiração e utilidade das Santas Escrituras[16];
d)    O respeito e a fidelidade à tradição[17]

Sobre o estilo e caráter desta Epístola, observa-se que esta tem mais forma epistolar que a primeira, a qual parece antes uma instrução do que uma carta e, sobre o seu valor doutrinal e literário, podemos notar que reina uma ternura de expressão e de imagens que fazem desse último escrito do grande Apóstolo um modelo de eloquência, “no qual a sua mente e coração projetam como que um derradeiro fulgor, semelhante ao do sol no momento em que, prestes a sumir-se no horizontem expede raios suaves com os quais parece enviar-nos seu adeus” (PEREIRA, 1912 p 149).

Finalmente, podemos afirmar que essas preciosas Epístolas devem ser lidas e relidas, bem como mantidas, por pastores e fiéis, continuamente diante dos olhos para delas fazer a regra constante de sua conduta e chegar assim, cada um no que lhe toca, à santidade e à perfeição de que o Apostolo Paulo, guiado pelo Espírito Santo, elencando regras que nunca deixaram de consultar os membros do corpo místico de Cristo que quiserem desempenhar fielmente suas obrigações e corresponder à vocação a que os chamou aquele que é Salvador do mundo.



REFERÊNCIAS
BERGANT, Dianne. Comentário Bíblico Volume 3: Evangelhos, Atos, Cartas e Apocalipse 7ed. São Paulo: Loyola, 2013.
BÍBLIA DE JERUSALÉM. Nova edição, revista e ampliada. São Paulo: Paulus, 2010.
FABRIS, Rinaldo. As Cartas de Paulo (III). São Paulo: Loyola, 1992.
PEREIRA, José Basílio. Novo Testamento: Epístolas dos Apóstolos e Apocalipse. Salvador (BA): Tipografia de São Francisco, 1912.



[1] (At 15,1; 2 Tm 1,5; 3,14)
[2] 2 Tm 3,14
[3] 1 Tm 1,1-20
[4] 1 Tm 2,1-15
[5] 1 Tm 3,1-16
[6] 1 Tm 4,1-16
[7] 1 Tm 5,1 – 6,2
[8] 1 Tm 6,3-21
[9] 2 Tm 1,1-5
[10] 2 Tm 1,6-2,13
[11] 2 Tm 2,14-3,13
[12] 2 Tm 3,14-4,5
[13] 2 Tm 4,6-22
[14] 2 Tm 1,6
[15] 2 Tm 2,5-12; 4,7-8
[16] 2 Tm 3,15-17
[17] 2 Tm 1,13-14; 3,14